segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Percepção

Sentada no bar, observando o gelo que derretia no fundo do copo, eu tamborilava uma musica qualquer com os dedos.
- Você gosta dela? - quando o homem fala comigo eu me assusto e bato a mão no copo.
- Como?
- Britney Spears. - ele sorria para mim. Belo sorriso, por sinal. - Você gosta dela?
Eu dei os ombros.
- Não sou grande fã, mas ela é legal.
- Estranho... - ele pareceu pensativo por um momento. - As pessoas são muito extremistas quando o assunto é ela. Em geral elas amam ou odeiam... Conhece esse jogo?
- Não. Como é.
Ele me explica, contente. Alguém diz um assunto, uma pessoa ou qualquer outra coisa e você decide se ama ou odeio. Não vale ser neutro.
- E se eu for neutra? - eu perguntei desconfiada.
- Não é permitido ser neutro. Então escolha - ele dá um gole no 'sabe-lá-o-que' ele está bebendo - Britney Spears: Ama ou odeio?
Eu penso por um segundo e respondo hesitante.
- Hum... Odeio. E você?
- Ótimo, eu também.
- Jura?
- Claro. Mulher sem nenhum talento. - ele aponta para mim - Sua vez.
- Não tenho ideia nenhuma. Vai você.
- Ok... Calça boca-de-sino?
Dessa vez, eu não preciso pensar para responder.
- Odeio, é tão cafona!
- Eu sei, também odeio.
- Minha vez: Paul McCartney?
- Amo.
- Eu também.
Continuamos a jogar enquanto o gelo derretia no meu copo.
No fim das contas, nós dois amamos - ou pelo menos amamos mais do que odiamos - assistir campeonatos de poker pela tv, musicas antigas e o Bill Clinton. Nós dois odiamos - ou odiamos mais do que amamos - pessoas que moram perto da praia (pelo fato delas morarem perto da praia mas nunca irem à praia), gatos magros e o Ross de Friends. Desempatamos sobre vodca (eu acho amargo, ele ama qualquer coisa que tenha alcool), bichos de pelúcia (eu amo, ele tem alergia), Brad Pitt (ele ama, eu ainda não o perdoei por terminar com a Jennifer) e filmes que se passam no interior (eu amo, ele não consegue parar de pensar no cheiro do lugar).
Percebo que eu gosto (quer dizer, amo) desse jogo. Ser radical, tomar um partido, ficar de um lado. Tudo ou nada. Faço o mesmo com você. Mudo de opnião sobre você várias vezes mas sempre sendo extrema: amo, odeio, amo de novo, odeio de novo.
Sabe aquela história da "linha tênua"? Pois é, percebi que é tudo verdade. Lembro da minha mãe me dizendo que o oposto do amor não é o odio, sim a indiferença. Esse é meu objetivo. Ser indiferente a você.
Percebo que o gelo do meu copo virou agua. É hora de ir para casa.
- Posso te acompanhar? - ele pergunta e eu dou os ombros. Que mal teria aquilo?
Nós caminhamos juntos até meu apartamento e quando chegamos na porta, eu brinco com a chave entre os dedos. Tomara que ele não tenha visto aquele filme. Por favor, não tenha assistido...
Ele ri baixo e eu percebo que ele assistiu o filme. Ah, que se dane. Ele se aproxima e eu não faço menção de me afastar. Ele toma isso como um "sim" definitivo.
- Eu realmente preciso entrar - eu me afasto e ele não me segura.
Quando eu murmuro qualquer "Tchau" baixo, ele segura minha mão. Eu viro.
- Beijar alguém que você acabou de conhecer: Ama ou odeia?
Eu rio.
- Amo.
Ele dá um sorriso sarcástico.
- Concordo.
Destranco a porta e enquanto giro a chave na fechadura, fico imaginando se ele também mentiu.